domingo, 3 de julho de 2011

Meu aniversário... Tempo de refletir...

O tempo passa para todos nós. Em geral, isso é muito bom.
É bom principalmente porque apreendemos. Acho que aprendemos tudo com os outros. A única tarefa realmente pessoal é a decisão do que fazer com o que se apreende.

Hoje, resolvi colocar aqui no blog trechos de obras que li. É uma lista afetiva. Não tenho maiores motivações, explicações, justificativas, cronologias. Só vou dizer que significaram muito para mim em diferentes épocas. E continuam significando, reverberando, me formando, por assim dizer. Afinal, hoje é dia 3 de julho, um dia depois do meu aniversário.

Dedico esses trechos aos meus amigos, de perto e de longe.

"I have frequently seen people become neurotic when they content themselves with inadequate or wrong answers to the question of life. They seek position, marriage, reputation, outward success or money and remain unhappy and neurotic even when they have attained what they are seeking. Such people are confined within too narrow a spiritual horizon. Their life has not sufficient content, sufficient meaning. If they are enabled to develop into more spacious personalities, the neurosis generally disappears. For that reason, the idea of development was always always of the highest importance to me." (C. G. Yung, Memories, dreams and reflections)

"Ó madrugada, tardas tanto... Vem...
Vem inutilmente,
Traze-me outro dia igual a este, a ser seguido por outra noite igual a esta
Vem trazer-me a alegria dessa esperança triste,
Porque sempre és alegre, e sempre trazes esperança, segundo a velha literatura das sensações.
(...)
Noite absoluta, sossego absoluto lá fora.
Paz em toda a Natureza.
A Humanidade repousa e esquece as amarguras.
Exatamente.
A Humanidade esquece as suas alegrias e amarguras.
Costuma dizer-se isto.
A Humanidade esquece sim, a Humanidade esquece.
Mas mesmo acordada, a Humanidade esquece.
Exatamente. Mas não durmo. "(Fernando Pessoa, Insônia)

"O desejo de enriquecer e a pulsão de domínio, essas duas formas de aspiração ao poder, sem dúvida nenhuma, motivam o comportamento dos espanhóis; mas este também é condicionado pela que fazem dos índios, segundo a qual eles lhes são inferiores; em outras palavras, estão a meio caminho entre os homens e os animais. Sem esta premissa especial, a destruição não poderia ter ocorrido.
Desde a sua primeira formulação, essa doutrina da desigualdade será combatida por uma outra, que ao contrário, afirma a igualdade de todos os homens; assistimos pois a um debate e será necessário prestar atenção às duas vozes presentes. Ora, esse debate não põe em jogo somente a oposição igualdade-desigualdade, mas também aquela entre identidade e diferença; e esta nova oposição, cujos termos não são menos neutros no plano ético do que os da precedente, torna mais difícil julgar as duas posições. Já vimos em Colombo: a diferença se degrada em desigualdade; a igualdade em identidade; são essas as duas grandes figuras da relação com o outro, que delimitam seu espaço inevitável." (Tzvetan Todorov, A conquista da América: a questão do outro)


"Nessa mesma noite, gaguejara uma prece para o Deus e para si mesma: alivia minha alma, faze com que eu sinta que a Tua mão está dada à minha, faze com que eu sinta que a morte não existe porque na verdade já estamos na eternidade, faze com que eu sinta que amar é não morrer, que a entrega de si mesmo não significa a morte e sim a vida, faze com que eu receba o mundo sem medo, pois para esse mundo incompreensível nós fomos criados e nós mesmos também incompreensíveis, então é que há uma conexão entre esse mistério do mundo e o nosso, mas essa conexão não é clara para nós enquanto quisermos entendê-la, abençoa-me para que eu viva com alegria o pão que como, o sono que durmo, faze com que eu tenha caridade e paciência comigo mesma, amém". (Clarice Lispector, Uma aprendizagem ou o livro dos prazeres)


Cabeceira

Intratável.
Não quero mais por poemas no papel
nem dar a conhecer a minha ternura.
Faço ar de dura,
muito sóbria e dura,
não pergunto
"da sombra daquele beijo
que farei?"
É inútil
ficar à escuta
ou manobrar a lupa
da adivinhação.
Dito isto
o livro de cabeceira cai no chão.
Tua mão que desliza
distraidamente?
sobre a minha mão? (Ana Cristina César, A teus pés)

quinta-feira, 30 de junho de 2011

PASSEATAS DIFERENTES

CONTARDO CAGLIARIS

DOMINGO PASSADO, em São Paulo, foi o dia da Parada Gay.
Alguns criticam o caráter carnavalesco e caricatural do evento. Alexandre Vidal Porto, em artigo na Folha do próprio domingo, escreveu que, na luta pela aceitação pública, "é mais estratégico exibir a semelhança" do que as diferenças, pois a conduta e a aparência "ultrajantes" podem ter "efeito negativo" sobre o processo político que leva à igualdade dos homossexuais. Conclusão: "O papel da Parada é mostrar que os homossexuais são seres humanos comuns, que têm direito a proteção e respeito, como qualquer outro cidadão".
Entendo e discordo. Para ter proteção e respeito, nenhum cidadão deveria ser forçado a mostrar conformidade aos ideais estéticos, sexuais e religiosos dominantes. Se você precisa parecer "comum" para que seus direitos sejam respeitados, é que você está sendo discriminado: você não será estigmatizado, mas só à condição que você camufle sua diferença.
Importa, portanto, proteger os direitos dos que não são e não topam ser "comuns", aqueles cujos comportamentos "caricaturais" testam os limites da aceitação social.
Nos últimos anos, mundo afora, as Paradas Gays ganharam a adesão de milhões de heterossexuais porque elas são o protótipo da manifestação libertária: pessoas desfilando por sua própria liberdade, sem concessões estratégicas. É essa visão que atrai, suponho, as famílias que adotam a Parada Gay como programa de domingo. A "complicação" de ter que explicar às crianças a razão de homens se esfregarem meio pelados ou de mulheres se beijarem na boca é largamente compensada pela lição cívica: com o direito deles à diferença, o que está sendo reafirmado é o direito à diferença de cada um de nós.
O mesmo vale para a Marcha para Jesus, que foi na última quinta (23), também em São Paulo. Para muitos que desfilaram, imagino que a passeata por Jesus tenha sido um momento de afirmação positiva de seus valores e de seu estilo de vida -ou seja, um desfile para dizer a vontade de amar e seguir Cristo, inclusive de maneira caricatural, se assim alguém quiser.
Ora, segundo alguns líderes evangélicos, os manifestantes de quinta-feira não saíram à rua para celebrar sua própria liberdade, mas para criticar as recentes decisões pelas quais o STF reconheceu a união estável de casais homossexuais e autorizou as marchas pela liberação da maconha. Ou seja, segundo os líderes, a marcha não foi por Jesus, mas contra homossexuais e libertários.
Pois é, existem três categorias de manifestações: 1) as mais generosas, que pedem liberdade para todos e sobretudo para os que, mesmo distantes e diferentes de nós, estão sendo oprimidos; 2) aquelas em que as pessoas pedem liberdade para si mesmas; 3) aquelas em que as pessoas pedem repressão para os outros.
O que faz que alguém desfile pelas ruas para pedir não liberdade para si mesmo, mas repressão para os outros?
O entendimento trivial desse comportamento é o seguinte: em regra, para combater um desejo meu e para não admitir que ele é meu, eu passo a reprimi-lo nos outros.
Seria simplório concluir que os que pedem repressão da homossexualidade sejam todos homossexuais enrustidos. A regra indica sobretudo a existência desta dinâmica geral: quanto menos eu me autorizo a desejar, tanto mais fico a fim de reprimir o desejo dos outros. Explico.
Digamos que eu seja namorado, corintiano, filho, pai, paulista, marxista e cristão; cada uma dessas identidades pode enriquecer minha vida, abrindo portas e janelas novas para o mundo, permitindo e autorizando sonhos e atos impensáveis sem ela. Mas é igualmente possível, embora menos alegre, abraçar qualquer identidade não pelo que ela permite, mas por tudo o que ela impede.
Exemplo: sou marido para melhor amar a mulher que escolhi ou sou marido para me impedir de olhar para outras? Não é apenas uma opção retórica: quem vai pelo segundo caminho se define e se realiza na repressão -de seu próprio desejo e, por consequência, do desejo dos outros. Para se forçar a ser monogâmico, ele pedirá apedrejamento para os adúlteros: reprimirá os outros, para ele mesmo se reprimir. No contexto social certo, ele será soldado de um dos vários exércitos de pequenos funcionários da repressão, que, para entristecer sua própria vida, precisam entristecer a nossa.

domingo, 26 de junho de 2011

Los Nadies - Narrado por Eduardo Galeano

Legendas em Português




Esse vídeo está sendo postado em homenagem às falas dos palestrantes do II Colóquio do Centro de Pesquisas "Margens", do IEL/UNICAMP. Obrigada, Suzi Sperber, Rosane Alencar, Jessé de Souza e a todos os que participaram do evento.